Sobre filmar sem dinheiro (ou John Carpenter)

Quando se fala das raízes do cinema de John Carpenter costuma-se deixar de fora da linha evolutiva seu primeiro longa, Dark Star (1974). Tal produção é tida mais como filme de estudante do que um filme propriamente dito.

Sabendo da força do universo do cinema de Hawks na carreira de Carpenter, até faz sentido buscar um começo, a fundação de uma obra, em Assalto à 13ª DP (Assault on Precint 13, 1976), filme que tem muito de uma dos filmes mais conhecidos de Howard Hawks, Onde Começa o Inferno (Rio Bravo, 1959). Mas não vou me estender na comparação Hawks-Carpenter porque o dossiê que a Revista Contrampo fez há alguns anos já é muito efeito neste sentido [confira aqui o material completo].

Quero voltar a Dark Star. Falar-se-á muito de Carpenter nos próximos dias porque sua obra vai ganhar uma ampla retrospectiva durante o Festival do Rio, que começa no dia 27 – eu mesmo pretendo escrever algo mais elaborado na Revista Interlúdio. O que interessa neste post é a vitalidade de um filme irregular e imperfeito produzido quase que artesanalmente.

Anseio para ver a reação do público no Festival do Rio quando Dark Star tomar de assalto a tela do CCBB. Vão rir tal como fizeram em algumas cenas de Prelúdio Para Matar (Profondo Rosso), de Argento? Possível, bem possível. Como não rir dos efeitos especiais de um filme de ficção científica feito numa era anterior às bobagens ultratecnológicas de George Lucas?

Aí que reside a divertida contradição do filme. Ao mesmo tempo que se ri da tal nave espacial que orbita, existe uma admiração pela elaboração de Carpenter, pela maneira em como ele fez um filme a partir de muito pouco. Muitas cenas internas, música, movimentos de câmera para dar dinamismo e um arranjo moleque para enquadramentos “verticais” (a cena em que um dos tripulantes leva um baile de uma bola gosmenta grande e fica preso num elevador prestes a ser esmagado, uma sequência à Lubitsch num filme sci-fi!).

O Carpenter até Enigma do Outro Mundo (The Thing, 1982) não tinha grandes orçamentos, não fazia filmes de estúdio. Mas não deixou de fazer filmes nos quais acreditávamos (vide o recurso da elipse e da câmera subjetiva para a explosão do avião contra um arranha-céu em Fuga de Nova York (Escape From new York, 1981).

Os efeitos em CGI podem ter dado uma outra perspectiva em termos de ultrarrealismo. Mas para um espectador disposto a ver cinema, não participar de um parque de diversões (leia-se: filmes de Michael Bay), longas como Dark Star sobrevivem pois não sua capacidade em ser cinema não caduca. Apenas seus efeitos especiais.

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