Me chamou atenção em 42 – A História de uma Lenda, cinebiografia do primeiro jogador negro de beisebol – Jackie Robinson – a integrar a MLB e iniciar o rompimento da estrutura racista naquele esporte: a repetição do diálogo “Não reaja”.
Ao decidir contratar um jogador negro – lembremos que até 1947 existiam a MLB, a liga dos brancos, e inúmeras ligas menores apenas com negros –, o diretor do Brooklyn Dodgers explica a Robinson o porquê de tê-lo escolhido: “Preciso de um jogador que tenha os culhões de não responder [às provocações]”.
Não duvido que, além de seu talento como jogador – bom rebatedor e muita velocidade para roubar bases –, o que garantiu a sobrevivência de Robinson numa estrutura racista sofisticada, que atribui a culpa à vítima, é a não-reação. Ficar quietor, fazer o seu trabalho, mostrar-se bom cidadão (de preferência pai de família), andar bem vestido e falar direito foram passaporte, num momento pré-Civil Rights Movement, para conseguir algum respeito.
Mas 2013 não é 1947. Ainda que aceite a intenção do filme em representar a postura de uma época, não consigo desfarçar o desconforto no elogio à não-reação em 42 – A História de Uma Lenda. Há um componente político em tal escolha, seja ela consciente ou não.
Para qual público se dirige o filme de Brian Helgeland? Pois bem, repetir que a solução é não reagir, não responder às ofensas, não se articular contra à impunidade do racismo num filme produzido em 2013 – mesmo que retratando um contexto de cinquenta anos atrás – implica uma responsabilidade.
Todos os personagens negros do filme estão entre a docilidade e a resignação. Robinson responde ao racismo indo para o vestiário e destruindo um taco. Seu assistente/assessor de imprensa se conforma com a proibição para negros frequentarem a sala de imprensa. Sua mulher, no começo indignada, vê sua rebeldia diluída no decorrer do filme.
Quem reage? Os brancos. O dono do time, que manda outros managers racistas para aquele lugar. Os colegas de time, que peitam um técnico adversário.
Repito: o contexto do filme é pré-Direitos Civis, Rosa Parks, Luther King Jr., Sidney Poitier, Panteras Negras etc. Mas reiterar o “não reaja” traz implícita uma escolha que é política, aceite-se ou não.
Me interessam mais os que reagem. Um Django Livre me diz mais do que um 42 – ainda que problematize um acesso ao heroísmo condicionado pelo branco [leia aqui]. Que venham mais heróis que reajam, mais herdeiros do Blaxploitation, mais Sweet Sweetback’s Baadasssss Song.
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Entra nessa conta também o Linconl, né? Que passa duas horas tentando nos fazer ver como os brancos foram magnânimos e permitiram que os negros fossem livres. O que veio antes (e depois)? Não importa.
Badass Song é sobre reação e cinema. Django, de certa forma, também. Não vi 42, mas tal associação me fez procurá-lo.